
Em 2004 via Beyblade, andava no 4º ano, fui aos E.U.A., o F.C.P. foi campeão europeu, o youtube ainda não existia e ainda não tinha telemóvel. Ir de Odivelas à Praça de Espanha era como ir de Lisboa ao Algarve. Ouvia música num discman azul que o meu avô me deu. Ouvia Thursday, The Juliana's Theory, Coldplay, Avril Lavigne, Nickelback, ... e Bloc Party. Sacava as músicas do emule e queimava os discos no Nero Express. Aparentemente era o gajo mais “diferente” da minha escola, pois a playlist da minha vida, à altura, se baseava nas músicas que descobria através do meu avô (geralmente música dos anos 60/70 que passavam no Rádio Clube Português quando íamos de férias para o Algarve) e nas músicas que me descobriam a mim. Os Bloc Party foram um desses casos.
Corria o mês de maio de 2004. Como é que eu sei? Simples, Grande Prémio do Mónaco de F1, transmitido na RTP1 (quando ainda se preocupavam em ter uma programação diversificada). Foi no intervalo da emissão, após o acidente do Fernando Alonso à saída do tunel (hehe), que um anúncio da Vodafone explode nos ecrãs da Grundig da minha sala. Anúncio esse que falava de um qualquer novo telemóvel ou de um novo tarifário lançado pela marca, que na altura tinha o slogan de “How Are You?” e a "Banquet" como banda sonora. Música que me fez ficar colado ao ecrã, não para prestar atenção aos tarifários da Vodafone mas sim para ouvir a canção que rodava no background.
Foi assim o meu primeiro contacto com a banda. Só consegui descobrir a música, quase um ano depois, aquando do lançamento do álbum, através do emule. De início fiquei contente apenas por ter conseguido descoberto a tal música do anúncio não prestando muita atenção às outras... típico. Até que num dia (em finais) de 2005, já com o youtube popularizado, vejo um vídeo de futebol com uma música de fundo do cara%&#... era a "Helicopter"... dos Bloc Party. Posto isto, decido ouvir o disco, que permanecia há alguns meses na pasta “downloads” do computador do meu pai, e foi aí que a minha vida mudou! Enquanto os meus colegas apreciavam as curvas das Pussycat Dolls, o rap do 50 Cent e a solidão do Akon, eu ouvia Bloc Party. Mesmo não percebendo nada do que diziam as letras, eu gostava, e a música é isso mesmo: o som que te agarra por si mesmo, fazendo-te sentir coisas que nunca sentiste antes.
A primeira experiência de “guerra interna” que tive (que feito por muitas pessoas se dá o nome de mosh pit) foi ao som de "Positive Tension", após a exclamação de Kele Okereke “So fucking useless!” (possivelmente a única coisa que sabia o que significava na canção) seguida de um clímax de solos e sons de pedais feitos pelo exímio Russel Lissack, que nos álbuns posteriores explorou muito mais essa vertente. O feeling mantém-se 10 anos depois.

"Like Eating Glass" já foi o meu despertador (e não, não me fartei da música), já fiz uma declaração de amor, ou algo parecido, com a letra de "Blue Light". "This Modern Love" ficará para sempre marcada no meu coração por razões pessoais que não vou enunciar, "Price Of Gasoline" fez-me pensar um pouco na política mundial e nos tempos que corriam à altura (e ainda correm). “The price of gas keeps on rising, nothing comes for free” foi a frase mais verdadeira e atual que ouvi numa música quando eu tinha 10 anos. Enfim, com o passar dos anos, e com a sucessiva audição deste fantástico disco, fui ligando cada música a um momento particular da minha vida, até chegar ao momento em que já não existem mais vagas (músicas) por preencher.
Falando mais do álbum em si, é uma obra-prima da música pop. Da música 1 até à 13 consegue transportar-te por uma infinidade de sentimentos. "Like Eating Glass" é a faixa de abertura que todos os discos deviam ter: sentimental, técnico, catchy, tocante a todos os níveis. O baixo juicy, os breaks sucessivos de bateria após o refrão, a voz desesperante do Kele enquanto grita “Like eating poison, like eating glass” sobre o facto da sua pretendente (ou do seu) não atender as suas chamadas. Para um rapaz que se iniciava na vida amorosa isto faz todo o sentido e até para os que vão full loving, o sentimento é este mesmo! "Helicopter" é a música mais rock do álbum (3 minutos e 40 demasiado curtos), "Positive Tension" é a simbologia da revolta e da raiva, assim como "Luno", que explode, duplamente, exatamente do mesmo modo, solos e efeitos de pedais everywhere. "Banquet" é o single forte do disco, ganhando em comercialidade mas não perdendo em qualidade. "She's Hearing Voices" é a canção mais dançável do registo. "Little Thoughts" é a “continuação” da 1ª faixa, o seu sentimento agridoce agarra o ouvinte de uma forma tão potente que o paralisa (”I'll go back if you ask me”). "Price Of Gasoline" é um wake-up call ao governo do Mr. G. W. Bush ("Red, red, white and blue, I can tell you how this ends, We're gonna win this!"). "This Modern Love" é a não-balada mais perfeita da nossa geração. As baladas "Blue Light" e "So Here We Are" são de um imenso nível lírico e sónico (confesso que já chorei muitas vezes ao som da primeira). Tudo acaba em "Compliments", música de quase 5 minutos, que funciona como uma espécie de calma após a tempestade.
Silent Alarm é um álbum desesperadamente equilibrado, verdadeiro, furioso, enérgico, apaixonado, triste. E de uma versatilidade incrível, que nos faz meditar sobre a vida de uma forma construtiva e consciente. O abrigo perfeito das terças-feiras chuvosas. Não há uma música má, nenhum filler, nada a apontar! Uma estreia perfeita!
Definitivamente um dos melhores discos da década passada, e da minha vida. O disco que me abriu os horizontes musicais aos 10 anos, e que ainda o faz aos 20.
Parabéns Silent Alarm, parabéns Bloc Party!