Astronoid - Astronoid (Blood Music)
Numa primeira audição, os Astronoid inserem-se numa miríade de caixinhas preconceituosamente abertas para os receber. Eles são os “Cynic misturados com Intronaut”, eles são “duros mas com laivos shoegazianos”, eles roçam uns “Protest the Hero mais angelicais”. A segunda audição reduz a repartição: já são os tipos que tocam aquele metal progressivo que faz imaginar vegetação a florescer, que permite simultaneamente o headbang e o enternecedor brilho no olho. A audição seguinte é quanto basta para lhes granjear uma caixinha preconceituosa própria. São os Astronoid e o estilo é só o deles. - PS
Beirut - Gallipoli (4AD)
Gallipoli é um regresso apaixonado aos primórdios de Beirut. Zach Condon dedica-se a compor e orquestrar uma solarenga viagem pelos balcãs, libertando-se das pressões da crítica e do tempo. A música soa espontânea, fluída, corpulenta e alegre, e relembra-nos da sonoridade inicial que envolveu em hype o projecto de Santa Fé. No entanto, aos ouvidos de hoje, soa-nos datado, quase como se a música dos Beirut não tivesse evoluído. Não obstante, e depois do pãozinho sem sal No No No, temos de aplaudir Condon por fazer a música que o apaixona, e não a que lhe exigem. - JR
Boy Harsher - Careful (Nude Club)
Parece que o sex appeal, suado e bem conquistado, da dupla Boy Harsher tem convencido toda a aura do post-punk/darkwave atual. Há poucos aspetos que consigam salvar elogios brutais no gênero, mas no caso de Careful, é caso para dizer que menos é mais. Os refrões, as melodias, os synths e a batida embriagada mas tão contagiante, todo o conjunto da vibe e da dança, levam o troféu. Quem diria que o revival estaria tão bem entregue? - JMA
Candlemass - The Door To Doom (Napalm)
Foi em setembro do ano passado que os Candlemass anunciaram o regresso de Johan Langquist ao fim de 32 anos de ausência. Este, que é o vocalista original da banda, foi a voz no histórico Epicus Doomicus Metallicus, disco editado em 1986 e uma das mais importantes referências no que agora é chamado de Doom Metal. Com este regresso, a banda pretendia um retorno às suas raízes, alma e essência. The Door to Doom é editado já no início deste ano e a verdade é que não só consegue apresentar esses elementos clássicos como, ao mesmo tempo, mostra uma sonoridade doom completamente atual. A voz de Langquist remete para o chamado Epic Doom e é acompanhada por baixos pesadíssimos numa produção exemplar. Uma atmosfera densa mas ao mesmo tempo libertadora, não se limitando este disco a ser apenas uma porta para o Doom, mas também uma amostra do melhor Heavy atual. - BP
Dream Theater - Distance Over Time (Inside Out Music)
Sim. Por vezes temos a sensação de estar numa aula de virtuosismo instrumental. Mas é ou não é agradável assistirmos a aulas de matérias que não nos interessam muito, se o professor for realmente bom e eloquente? É a analogia perfeita para Dream Theater. O estandarte máximo da história do metal progressivo lança Distance Over Time, produzido pela primeira vez pelo guitarrista John Petrucci. Alvo de plágio de capa por parte do The New York Times Magazine ou não, o disco é uma repetição daquilo a que nos têm habituado: qualidade e mestria. - PS
Fange – Punir (Throatruiner)
Este quarteto de Rennes é um dos motivos pelos quais França tem sido berço da nouvelle vague de música extrema. Fange promove chacina em forma de sludge com uma espinha dorsal bem vincada no hardcore punk. Punir junta o melhor dos dois mundos com uma natureza castigadora, ambivalente, excêntrica e veloz. Energia otimizada para domar o peso do mundo com Entombed e Converge a servirem de inspiração. - JMA
Ithaca – The Language Of Injury (Holy Roar)
Nesta última década, o metalcore tem aprofundado o mercado com grande saturação e previsibilidade. Não faltam estratégias sonoras que pouco ou nada de inovador têm para oferecer. Sem grandes tendências para o sensacionalismo, Ithaca destacam-se não só por ignorarem algumas dessas fórmulas de “sucesso”, como por investirem numa secção instrumental sem precedentes. Não há um único instante onde o ouvinte possa prever o que está para vir. Só por isso, Ithaca merece o brinde! - JMA
Kaleikr – Heart Of Lead (Debemur Morti)
Os Kaleirk são uma banda que se pode incluir na recente vaga de black metal islandês, um movimento que nos últimos anos tem posto em evidência nomes como Misþyrming, Naðra ou Svartidauði. Em Heart Of Lead, a banda nórdica não se limita a seguir a receita destes exemplos, adicionando uma virtuosa componente progressiva. Para além disso, o grupo leva ainda mais além a vertente atmosférica no seu som, garantido que o ouvinte é transportado mentalmente para as idílicas paisagens islandesas, ao mesmo tempo que a melodia sentimental apela à melancolia. Quase como se fosse um trabalho colaborativo entre Emperor e Enslaved executado num recôndito local da belíssima ilha. - BP
Panda Bear - Buoys (Domino)
Imaginem um grupo de escuteiros sentados à volta de uma fogueira a assar marshmallows. De repente, um lobito - Pedro Jorge (nome fictício) - saca de uma pastilha de LSD e ingere-a. Ao mesmo tempo um explorador saca da sua viola e começa a tocar Mi, Mi7, Lá, Lá-, Mi, Fá#-, Si7, Lá, Si7, enquanto todos os outros coleguinhas escuteirinhos começam a cantar “Um girassol, florido no jardim/ Buscando a luz do Sol, sorriu para mim (...)”. Na cabeça de Pedro Jorge, tocou Buoys de Panda Bear. Assim até vale a pena ser escuteiro. - JR
Primitive Man x Hell - Split (Translation Loss)
Os métodos de tortura podem assumir várias formas e há até quem retire prazer disso. Uma fórmula que se tem vindo já a tornar um hábito com Primitive Man, volta então a ver a fasquia elevada com a participação dos conterrâneos Hell. Um split com três temas é quanto baste para nos transportar ao sétimo nível do inferno. O blackened sludge de Primitive Man continua a atingir as têmporas de forma desconcertante, enquanto os Hell optam por explorar um terreno mais confortável, mas nem por isso menos pantanoso. Deixemo-nos embalar por esta violência controlada. - AT
Soen - Lotus (Silver Lining Music)
Regressam a Portugal no final de março. Os suecos apresentam Lotus, o sucessor de Lykaia, e mantém-se em rampa de crescimento. Riffs deliciosos, melodias vocais de uma nostalgia Serj Tankiana e uma coesão de obra bem balanceada. Para quem não os conhece, será certamente uma agradável surpresa. Para os seguidores, Lotus antevê a possibilidade de voos mais altos para o nicho do metal progressivo. - PS
The Young Gods - Data Mirage Tangram (Two Gentlemen)
Velhos são os trapos e ninguém melhor do que The Young Gods para nos relembrar isso. Passados oito anos desde o lançamento do seu último trabalho, os suíços regressam com um álbum que dificilmente se poderá classificar como neutro. Quase que conseguimos imaginá-los num cenário desértico, divididos entre extensas paisagens de electro-noise e guitarras hipnóticas. A voz de Franz Treichler aparece em momentos chave e alcança-nos o subconsciente em tom de sussurro. Destaque para o tema “Tear Up the Red Sky”, há dias em loop. Inesperado, mas sem dúvida digno do seu título “tangram”, com sete peças que encaixam na perfeição. - AT
Vanum - Ageless Fire (Profound Lore)
Basta saber que por trás de Vanum estão membros de Ash Borer, Yellow Eyes e Superstition para se perceber a abundância de riffs que transcende a atmosfera em algo épico. Sempre brindado pelo talento em questão, Ageless Fire promulga um balanço incrível entre agressão e nostalgia. Uma mão cheia de malhas memoráveis com hooks e cavalgadas que podem muito bem convencer os fãs mais puristas de Bathory. - JMA
Xiu Xiu - Girl With The Basket Of Fruit (Polyvinyl)
Girl With the Basket of Fruit é uma experiência que transcende em muito a sua própria musicalidade. Os Xiu Xiu já nos habituaram a experienciar música como arte, e no caso deles, uma arte muito própria. A mistura de electrónica, com folclore, ambient e punk ganha neste novo trabalho uma dimensão passivo-agressiva, constantemente esquizofrénica, com momentos de tremenda delicadeza e beleza a conspurcarem-se (positivamente) com obscuridade e sujidade. Num momento somos compelidos a abraçar a agressividade, para num momento logo seguinte nos forçarem os comprimidos pela garganta abaixo. - JR
YERÛŠELEM - The Sublime (Debemur Morti)
Aqui se estreia a mais recente extensão dos senhores de Blut Aus Nord. À primeira instância, é inevitável associar Godflesh à batida mecânica que interliga o fio condutor da escrita, mas The Sublime é muito mais do que isso. O álbum destrói e reconstrói em sucessiva robótica. Um mecânico transcendental de utopias e sonhos paisagísticos onde o neo-gótico de Coil e Autechre se fundem com as pulsações industriais de Mayhem nos anos 90. Dito isto, YERÛŠELEM alimenta-se muito das suas inspirações mas colhe os frutos de um universo próprio. Sem dúvida, uma lufada de ar fresco. - JMA
Artigo escrito por Andreia Teixeira (AT), Bruno Pereira (BP), João "Mislow Almeida" (JMA), João Rocha (JR) e Pedro Sarmento (PS).