777negative111 - Tower of Glass
Notando já a chegada de uma pletora de artistas portugueses a assolar o underground com esculturas sonoras que impõem uma presença absurda, 777negative111 é tudo menos um novato. Também conhecido por J. Faria, o compositor baseado em Lisboa já compõe uma veia artística mais do que segura. Havendo já lançado monumentais registos como I am aware or our futile existence, onde explora o harsh noise através de urban decay, ou I don’t need this place, onde o J. se deixa vulnerável ao atrito da depressão clínica, chega a 2020 com um passo para evoluir o seu som. Para além de testemunhar esse mesmo virar de página, Tower of Glass afirma e reafirma um sonoro que promete grande potencial na visão de J. Muitas vezes a suscitar as estéticas do industrial barroco, repetitivo, seco e duro de Vatican Shadow, Function ou Silent Servant, o resultado permanece na memória com todo o mérito independente. Ainda mais ênfase merece pelo seu lançamento 100% DIY pelas mãos do próprio J. Mais um nome a relembrar desta nossa crescente cena musical, que mesmo passando por dias menos asseguradores, continua a dar que falar - JMA
Automatism - Immersion (Tonzonen)
Immersion – tal como o seu nome assim sugere – convida o ouvinte a embalar num imperturbável estado de profunda imersão. Baseado num viajante, místico, cinematográfico e deslumbrante psychedelic rock de ambiência meditativa, em harmoniosa concordância com um magnetizante, profético, pérsico e dançante krautrock de cadência repetitiva, e um extasiante, educado, delicado e enfeitiçante modal jazz que nos esperta os sentidos, esta magistral obra de Automatism – integralmente condimentada e conduzida em formato instrumental – tem a capacidade de nos rebaixar as pálpebras, massajar o cerebelo, relaxar os membros, apaziguar a alma, e catapultar a nossa consciência na vertiginosa direção da incomensurável negrura que oxigena e aduba o solo cósmico. São 47 minutos inteiramente atestados de uma resplandecência diluviana que nos banha e entope as zonas erógenas da alma. Deixem-se dissolver, inebriar e embevecer pela mélica, paradisíaca e anestésica sublimidade vaporizada por Automatism, e comunguem com inteira devoção um dos álbuns mais balsâmicos e nirvânicos do presente ano. - NT
(Lê a review completa a este disco no blog El Coyote)
BleakHeart - Dream Griever
Composta por um vaporoso, melancólico, distópico e brumoso shoegaze de enfeitiçante sublimidade que se desenvolve, obscurece, enrijece e revolve num poderoso, misantrópico, atmosférico e umbroso doom metal de inflamante ferocidade, a sua sonoridade outonal, noturna e pastoral – a fazer(-me) recordar a inglesa Rose Kemp e os californianos Giant Squid – balanceia o ouvinte entre a anestésica, sidérica e introspetiva prostração e a trevosa, vigorosa e emancipadora comoção. Este é um álbum embrumado a doce melancolia. Um registo tristemente belo que decerto não deixará nenhum dos seus ouvintes recostado à indiferença. Não vai ser fácil desentorpecer da lúgubre toxicidade por ele nebulizada, e despertar deste profundo estádio de firme sonambulismo que nos climatizara, abalara e governara do primeiro ao derradeiro minuto. Recostem-se confortavelmente na penumbra, respirem profunda e vagarosamente, desmaiem as pálpebras sobre o olhar envidraçado, e mergulhem sem regresso assegurado no elegíaco obscurantismo de BleakHeart. - NT
(Lê a review completa a este disco no blog El Coyote)
Bleeding Out - Lifelong Death Fantasy (Profound Lore)
É relativamente fácil criar expectativas quando se ouve dizer que um novo projeto reúne membros de The Endless Blockade e Fuck The Facts. Ainda assim, tornou-se também bastante comum encontrar neste tipo de projetos more than meets the ear. É sem grande margem para erro que se agrupam as típicas notas de um grindcore primordial, punk hardcore e death metal old school com alguns palate cleanser moments, incluindo passagens dignas de sludge e outros tantos detalhes atmosféricos. Cria-se também uma paisagem macabra, marcada pela bateria decidida, tanto nos blast beats como no midtempo, e sobretudo por uma mão bem cheia de riffs orelhudos. Descomprometido, mas honesto. - AT
Bring Me The Horizon - Post-Human: Survival Horror (Sony)
Está aqui um dos melhores lançamentos do ano – é essa a sensação que nos invade o corpo quando absorvemos os nove temas da nova proposta dos Bring Me The Horizon. Criada como escape à atual pandemia e contando com produção adicional de Mick Gordon, compositor de jogos de vídeo que o frontman Oliver Sykes contactou após se ter apaixonado pela banda sonora de Doom Eternal, o que aqui temos é uma soberba mistura de sons e ambientes; desde nu-metal à la Linkin Park na faixa “Teardrops” a Deftones no tema “Parasite Eve”, passando pelo metalcore e a eletrónica, tudo é feito e apresentado com uma criatividade que nos deixa completamente boquiabertos. Efetivamente, estamos perante uma experiência espantosamente visual, como se nos tornássemos personagens de um jogo em tempo real – no fundo, mergulhamos na fantasia para que esta passe a ser a nossa realidade. Reunindo uma curiosa e variada lista de convidados, que incluem as BABYMETAL (numa das mais orelhudas e eficazes composições, ainda por cima), YUNGBLUD ou a Amy Lee, dos Evanescence, os Bring Me The Horizon voltam a provar que são das mais inteligentes bandas da atualidade, combinando peso e melodia com elegância e sensibilidade. - JA
Chamber - Cost of Sacrifice (Pure Noise)
O metalcore continua num intenso estado de mutação. Em evidência, surgem nomes como Jesus Piece, Code Orange, Year of the Knife, Candy e muito mais a liderar uma nova vaga de músicos americanos que estão atualmente a redefinir o hardcore que tanto tem vindo a ser celebrado. Oriundos de Nashville, Tennessee, Chamber alinham-se nesse mesmo escalão mas abraçando uma approach bem mais diferenciada do resto, que pede inspiração ao mathcore angular dos 90s – referem-se nomes como Converge, Botch ou Coalesce – para colmatar com uma parede de som aguerrida de agressão, groove e métrica em peso – sempre a mirar a progressão do futuro. Abraçando também encaixes de grooves que facilmente relembram Gojira ou Chimaira, o resultado final é único e mostra um tremendo potencial para o futuro próximo. - JMA
Cheap Wine - Schrödinger's Pipe (Celebrations Day)
Fundamentado num caleidoscópico, envolvente e quimérico psychedelic rock de aroma primaveril, um meloso, provocante e melodioso blues rock de roupagem vintage, e ainda um extravagante, majestoso e serpenteante progressive rock de aura fabular, este Schrödinger's Pipe ostenta desarmantes composições tricotadas e temperadas a destreza, sentimento e delicadeza. Um mélico, edénico e frutado trago que prontamente nos afaga, deleita e embriaga. Schrödinger's Pipe é um registo lavrado e maturado a uma apurada, doce e sublimada finura que nos satisfaz o imenso desejo de requinte. Deixem-se damejar e conquistar ao erótico e refrescante som de Cheap Wine e degustem um dos mais românticos álbuns desabrochados em 2020. Não vai ser nada fácil dissipar esta intensa ressaca em nós enraizada pelo sexteto francês. - NT
(Lê a review completa a este disco no blog El Coyote)
clipping. - Visions of Bodies Being Burned (Sub Pop)
Exatamente um ano após o incrível e altamente venerado There Existed an Addiction to Blood, e sem qualquer expectativa de um segundo disco depois desse, surge outro grande opus por parte do trio de hip-hop experimental. Visions of Bodies Being Burned é o quarto grande projeto de clipping. e sai ao mundo com um tremendo estrondo. Sendo promovido como uma continuidade, ou uma sequela, do seu antecessor, que havia sido feito em continuidade com o mesmo, é de deixar qualquer ouvinte pasmado como é que ainda existem artistas capazes de criar dois discos plenamente conceptuais – as ligações de horrorcore, filmes de terror e discurso ativista são abrasivas, no mínimo – sem qualquer soluço na sua finalização. Faixas como “Say the Name”, “’96 Neve Campbell”, “She Bad” ou até mesmo “Pain Everyday” não só surgem para elevar o nível do disco ao mesmo patamar que TEAATB, como o fazem a partir de tantos outros recursos tão menos funcionais e igualmente bem conseguidos. O resultado final coleciona dois discaços que prometem estatuto de culto num futuro próximo. - JMA
Corey Taylor - CMFT (Roadrunner)
CMFT pode não ser o mais profundo ou intenso disco da carreira de Corey Taylor, mas é sem dúvida um dos mais interessantes, surpreendentes e divertidos que o músico já gravou, encantando pela maneira como busca uma identidade musical fluida, eclética e propositadamente distante do estilo que lhe deu fama, tanto com os Slipknot como com os Stone Sour. O próprio título do álbum, que significa “Corey Mother Fucking Taylor”, parece enfatizar ainda mais essa vontade de se livrar de quaisquer correntes que o possam prender, lançando-se numa descontraída viagem que ora o conduz a um hard rock de doce sabor nostálgico – pense-se em AC/DC ou Van Halen –, ora o leva a compor baladas enérgicas e radiofónicas que parecem saídas dos anos 90 (“Silverfish”, por exemplo, soa a um inesperado encontro entre os Foo Fighters e os Stone Temple Pilots), havendo ainda espaço para homenagear os tempos em que o rock e o hip-hop começaram a andar de mãos dadas (a colaboração dos Run-DMC com os Aerosmith vem imediatamente à cabeça) na música “CMFT Must Be Stopped”, que conta com as participações de Tech N9ne e Kid Bookie. Ideal para ser ouvido numa roadtrip entre amigos – rock on and enjoy! - JA
Future Islands - As Long as You Are (4AD)
Os Future Islands já nos habituaram a reviver a magia algo nostálgica do new wave. As Long as You Are, o seu novo trabalho, é uma requintada sobremesa num menu que tão bem conhecemos. De facto, em nada ou pouco a banda de Baltimore acrescenta ao que tem feito até então. Ostenta a orquestração, aprimora as composições, mas a fórmula é a mesma do início. Teríamos problemas com isso, se o álbum não soasse tão bem! A voz de Samuel continua a ser uma lareira numa noite de inverno, o baixo e os sintetizadores um abraço amigo em tempos de isolamento. Apesar da falta de novidade, As Long as You Are é um álbum simplesmente bonito e quente, que não cansa o ouvido e pede uma noite de várias repetições. - JR
Galactic Superlords - Freight Train (Rock Freaks)
Oriundos de Colónia, na Alemanha, este jovem quinteto de classic rock começa a afirmar e reafirmar a sua presença nesta nova vaga de heavy metal a ressurgir pela europa fora. O seu novo testemunho, Freight Train, promete marcar uma presença avassaladora perante qualquer fã do estilo. Quer seja pela arrebatadora performance vocal por parte de Katharina Heldt, ou até mesmo por todo o paredão de som, ritmo e invocativo poderio de guitarradas, Galactic Superlords têm tudo para formar um futuro brilhante. Prestem atenção e deslumbre-se! - IM
Greg Puciato - Child Soldier: Creator of God (Federal Prisoner)
Child Soldier, o primeiro trabalho a solo de Greg Puciato, é uma fabulosa visita à frenética mente criativa deste senhor, um álbum transversal a géneros e verdadeiramente arrepiante no modo como exibe uma extraordinária intensidade emocional que mil palavras não conseguem descrever. Por vezes pesado e caótico, noutras alturas melódico e introspetivo, torna-se simplesmente impossível não nos perdermos neste universo onde violentas descargas na onda dos TDEP (“Fire for Water”), músicas que evocam o legado do rock alternativo dos anos 90 (“Deep Set”, uma espécie de cruzamento entre o industrial dos Nine Inch Nails e a atmosfera abrasiva e arrastada dos Alice in Chains), momentos soberbos de inspiração eletrónica (“Temporary Object”, ali a aproximar-se do que o músico faz em The Black Queen) ou até passagens acústicas, entre muitas outras coisas, habitam o mesmo espaço sem que isso se traduza em falta de coesão. Demasiado experimental e único para ser a continuação de algo já feito, mas cultivando um certo sentimento de familiaridade, até pela participação de velhos amigos ou companheiros (como o ex-baterista dos Dillinger Escape Plan, Chris Pennie), esta estreia representa tudo o que a música deve ser: livre, apaixonada, imaginativa e brutalmente honesta. - JA
HHY & The Kampala Unit - Lithium Blast (Nyege Nyege)
HHY pode já ser uma sigla reconhecível para alguns. O fenómeno que foram os HHY & The Macumbas, uma verdadeira experiência de laboratório que juntou afro-beat com psicadelia, levou os sentimentos mais viscerais para os palcos no ano passado. Agora, o nosso Jonathan Saldanha escreve, grava e produz em HHY & The Kampala Unit. Desta vez, junta-se à ativista e trompetista Florence Lugemwa e ao baterista Omutaba em Kampala, no Uganda, para continuar a sua exploração de sonoridades que exorcizam a essência de quem os ouve. Lithium Blast é o resultado desta união em que, numa só audição, já se deseja que mais trabalhos assim possam surgir. Apesar de ter ligeiras parecenças ao projeto Macumbas, este álbum vai buscar uma maior profundeza à eletrónica, ao techno ligeiro e trance, que acaba por dar um tom mais sombrio a todo o disco. Os batuques nativos criam um equilíbrio desconcertante, mas hipnotizador com os synths dos anos 80, elevando este registo a um ritual com uma energia cósmica inigualável. - CN
Laura Jane Grace - Stay Alive (Polyvinyl)
Laura Jane Grace, conhecida pelo seu trabalho como vocalista/guitarrista dos Against Me! e por ser uma das mais visíveis figuras no movimento punk rock a assumir-se como mulher transgénero, lançou recentemente um novo álbum a solo intitulado Stay Alive – uma escuta obrigatória para todos os que procuram música descomprometida tocada com o coração. Maioritariamente acústico, num tom bem enérgico que recorda Frank Turner, e com alguns apontamentos eletrónicos, reveste-se de uma honestidade de tal forma contagiante que só queremos abraçá-la por nos ter dado algo tão puro. Ao princípio a simplicidade extrema dos temas até pode nem cativar por aí além, mas tudo muda no momento em que nos deixamos levar pela força destas canções a transbordar de energia e emoções, canções que são apaixonadíssimos manifestos (em certos casos políticos) e que nasceram para ser ouvidas no mais intimista dos ambientes. E já dissemos que Portugal, especificamente o Porto, é mencionado na faixa “The Calendar Song” como um destino de eleição para a artista (que visitou a Invicta com a sua banda no NOS Primavera Sound de 2017)? Brincadeiras à parte, Stay Alive arrepia, comove e merece todo o nosso amor. - JA
Loma - Don’t Shy Away (Sub Pop)
Este disco será para quem aprecia um álbum a abarrotar de brincadeiras sensoriais, para quem gosta de vozes delicadamente ofegantes, cândidas, mas com equilíbrio e consistência; um álbum de movimento livre que nos diz para prestar atenção aos detalhes, quer os encontremos dentro deste disco ou fora dele. A forma como Loma dá florescência à dissonância, a diversidade de sonoridades que aqui serviram de influência, a seleção de instrumentos a fazer-se sentir como a junção de várias personalidades na mesma música, tudo acresce ao quão perplexante e cativante este disco consegue ser. Pode fazer-se sentir descontraído e paciente, a aproximar-se de uma abordagem mais minimalista, quanto pode acelerar num acumular de informações até que atinja um pico de entusiasmo. Don’t Shy Away é feito de uma variedade de humores expressos em coloridas peças de introspeção. - BF
METZ - Atlas Vending (Sub Pop)
Podemos tentar resumir os METZ a pujança e energia danada. Mas a verdade é que isso é muito redutor para exprimir o que se sente a ouvir Atlas Vending. O quarto álbum dos METZ voltou a equipará-los ao trabalho alcançado no primeiro disco. Com este novo disco, chegam ainda mais caóticos e barulhentos do que nunca, e é nesse mesmo ruído que se encontram de uma forma articulada a mostrar o que tão bem sabem fazer. Ora seja a bateria galopante de Hayden Menzies que quase fura o chão, ora as guitarras dilacerantes do também vocalista Alex Edkins. Porém, com uma construção mais estruturada e a estabelecerem-se for the long run, já não são músicas para ouvir de rompante e ocasionalmente. São, sim, canções para retornar vezes sem conta, contando em encontrar camadas cada vez mais profundas e bem orquestradas. Talvez a diferença aqui seja o quão próximo se mantém em transportar qualquer ouvinte para um concerto ao vivo. Nisso, existe uma sensação catártica e até experimental. Principalmente em músicas como “A Boat to Drown In”, que puxa um pouco pelo shoegaze misturado com sons que relembram A Place To Bury Strangers. Esta é a prova que ainda se pode esperar muito do trio canadiano. - CN
Molassess - Through the Hollow (Season of Mist)
Após a morte de Selim Lemouchi em 2014, Farida Lemouchi Oeds Beydals, Job van de Zande e Ron van Herpen transportaram para Molassess parte deste doloroso processo de perda, batizando-o com o nome de uma das faixas do projeto Selim Lemouchi & His Enemies. Molassess é o lugar onde cada faixa soa a uma estranha cadeia de visões do oculto, situado entre o sagrado e o profano, entre a obscuridade vintage e alguma cor contemporânea e onde se incorporam elementos sonoros que não se fazem juntar naturalmente, e que talvez não conectassem tão admiravelmente bem quanto pensássemos. Through the Hollow atinge um equilíbrio de suspense e volumes dramáticos que o fazem fluir num corpo de som envolvido por uma vastidão de proporções gigantescas. Com a voz forte de Farida a acrescentar à aura de misticismo deste disco, faz-se captar uma mistura de espiritualidade e desânimo. Não se trata de uma cerimónia fúnebre, ou de uma extensão do que outrora existiu, mas de um álbum onde a amargura do luto serviu de impulso a uma obra de arte única e fascinante nascida de solo devastado. - BF
Ozric Tentacles - Space for the Earth (Kscope)
Toda a vibe do rock psicadélico. É incrível estarmos em 2020, ouvir Space for the Earth, e automaticamente sentir que somos projetados para a década de 60, para a exploração intra e extrapessoal e para as viagens transcendentais. O grupo britânico, que conta com quase 40 anos de existência, prima uma vez mais pelas atmosferas sonoras, os motivos deliciosos, a sensação de embalo e os solos espaciais de outro mundo. Excelente companhia de relaxamento. - PS
Ruff Majik - The Devil’s Cattle (Mongrel)
Segue-se um álbum com calor suficiente para acompanhar viagens imaginárias pela Route 66. Depois do tempestuoso Tårn, Ruff Majik exploram agora a sujidade do motorbike rock e todas as suas alusões ao estilo de vida autodestrutivo que o segue, sem as ilusões de glamour. Com a adoção de um tema que tem tanto de clássico como de saturado, restam espaços em branco que fazem a diferença entre o interessante e o surpreendente, e preenchem-nos com um groove carnudo e convulsões in your face Ruff Majik™. Numa ampliação da lente para o blues rock, com aproximações à sonoridade de Queens of the Stone Age, é um disco com velocidade, riffs a espumar da boca e vocais a combinar. Disseram que The Devil’s Cattle seria uma “love letter to rock ’n roll”, e à boa maneira de Ruff Majik, transpira o seu tema por todos os poros. - BF
Touché Amoré - Lament (Epitaph)
Em Lament, quinto álbum do quinteto de post-hardcore californiano Touché Amoré, Jeremy Bolm e companhia levam-nos pela mão numa jornada profundamente íntima e pessoal, no que ultimamente constitui um sucessor (ideo)lógico ao anterior e tão-aclamado Stage Four. “Come Heroine”, primeira faixa do álbum, onde momentos tumultuosos alternam com passagens etéreas e shoegaze-y, tem um sabor estranho a urgência. É seguida de “Lamentation”, onde partes iguais de ode post-punk e lamentação elegíaca servem de pano de fundo para Bolm discursar sobre ansiedade e frustração. Em “Reminders”, um quintessencial hino hardcore, o tom celebratório disfarça um desabafo de impotência face ao panorama político dos EUA, servindo de lembrete sobre a necessidade de manter acesa a última réstia de esperança. Em Lament, que ainda conta com os vocais limpos de Andy Hull, dos indie rockers Manchester Orchestra, em “Limelight”, letras de cariz pessoal e autobiográfico aliam-se a uma apurada sensibilidade melódica, num álbum que nunca cai na monotonia ou no reme-reme. Num género em que a crueza emocional é praticamente pré-requisito, a candura com que Bolm já nos habituou fazem deste álbum uma experiência catártica e imprescindível. - HM
The Troops of Doom - The Rise of Heresy
The Troops of Doom não são uma banda de tributo aos Sepultura, mas sim o novo projeto de Jairo “Tormentor” Guedz, guitarrista original do grupo nos míticos Bestial Devastation e Morbid Visions – até hoje peças essenciais para qualquer colecionador do underground brasileiro. Decidido a recuperar o espírito dessa era dourada, juntou-se a Marcelo Vasco (guitarra), Alexandre Oliveira (bateria) e Alex Kafer (voz e baixo) para a criação de um EP de death metal old school que por vezes também abraça o thrash, reunindo a força e a garra de uma época que já não volta mas que permanece bem viva na memória de quem a viveu. De certa forma, o que aqui temos é uma viagem nostálgica adaptada ao presente – até porque a execução técnica e a produção estão bem acima do que os Sepultura fizeram nos seus primórdios – e onde a influência de nomes como Possessed ou Slayer é igualmente sentida. Apresentando um sólido conjunto de temas originais, com destaque para a autêntica malha que é “The Confessional”, e ainda duas potentes covers da influente ex-banda de Jairo (“Bestial Devastation” e a inesquecível “Troops of Doom”), este cartão de visita tem tudo para agradar a fãs antigos de Sepultura e a apreciadores de metal da velha guarda. - JA
Wobbler - Dwellers of the Deep (Karisma)
Este épico registo da adorável formação nórdica navega gloriosamente pelos mares de um aprumado, majestoso, charmoso e ornamentado progressive tock de estirpe revivalista e aura fabular – sublimemente magicado nos dourados e sagrados anos 70 onde se notabilizaram marcantes referências do género tais como Genesis, YES, Camel, Gentle Giant e os intratáveis Emerson, Lake & Palmer – que me envolvera, enfeitiçara e comovera do primeiro ao derradeiro tema. A sua sonoridade de vestes aristocráticas e crenças mitológicas – superiormente conduzida a faustosas, elaboradas, cuidadas e auspiciosas composições – bamboleia-se entre delicadas, contemplativas e espaçadas melodias climatizadas a bruma onírica e massajadas a embriagante placidez, e estonteantes, labirínticos e extravagantes remoinhos impecavelmente centrifugados pela provocante, incrível e dialogante simbiose instrumental. - NT
(Lê a review completa a este disco no blog El Coyote)
Woodkid - S16 (Polydor)
Praticamente sete anos após todo o hype (justificado) de The Golden Age, Woodkid regressa com um trabalho que não desilude os fãs da sua sonoridade. S16 é mais uma epopeia sonora, desta vez mais despegada da percussão, e mais linear na sua vertente eletrónica. O som continua a ser assombroso e espesso, com a voz de Yoann a intensificar todas as fragilidades do nosso ser. Cada faixa continua a crescer vagarosamente até ao seu clímax, e continuamos a ficar arrepiados. No entanto, o facto de tudo continuar igual, apesar de prazeroso, provoca uma rápida digestão das novas músicas apresentadas e, como tal, dificilmente voltaremos a escutá-lo do início ao fim. – JR
Zeal & Ardor - Wake of a Nation (MVKA)
O inovador projeto de Manuel Gagneux volta uma vez mais com um EP onde espelha o seu canto espiritual afro-americano misturado com laivos de black metal. Este trabalho é composto por seis faixas e foi propositadamente lançado antes das eleições norte-americanas. O disco surge como resposta ao assassinato de George Floyd, no início deste ano. Musicalmente, o grupo mantém-se capaz de passar da bonita balada ao portentoso peso. Vale a pena ouvir e pensar no ano em retrospetiva! - PS
Artigo escrito por: Andreia Teixeira (AT), Beatriz Fontes (BF), Catarina Nascimento (CN), Hugo Moreira (HM), Inês Martins (IM), João “Mislow” Almeida (JMA), João Rocha (JR), Jorge Alves (JA), Nuno Teixeira (NT) e Pedro Sarmento (PS).