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Amplifest 2019 [12-13Out] Texto + Fotos

12 de Novembro, 2019 ReportagensJoão "Mislow" Almeida

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Hard Club

Nivhek - Igreja de St. George, Lisboa [5Nov2019]

Efterklang - Hard Club, Porto [24Out2019]
O real significado de carinho transcende muitas vezes o simples “gostar de algo”. A apreciação coexiste, tal como todo o seu afeto. Mas carinho alonga-se e propaga-se de uma forma distinta. Algo que se nota nos gestos, nas palavras e no genuíno calor humano. Pode tratar-se de um reencontro de caras familiares, amizades que ainda há pouco se cruzaram e que subsistem a reencontrar-se, ou até mesmo na criação de novos laços. Havendo um ponto de encontro que suscite ainda mais esse carinho, está-se destinado a respirar e a sentir essa palavra além das suas sílabas. Será tudo isto um pouco irrelevante, desgostoso ou excessivamente romantizado na nostalgia do passado? Ou será tudo isto nascido de uma saudade inadvertidamente impossível de contornar? A saudade é real, tal como todo o carinho vivido num tal fim de semana no Porto. Relembram-se os instantes de chegada ao alto e imponente Hard Club, numa tarde de outubro que brindava e recebia de braços abertos o muito aguardado retorno do Amplifest. “O deles, o vosso, o nosso Amplifest.”

Ambiente e Emma Ruth Rundle


Sábado foi simbólico a tudo o que este festival representa. Veem-se corredores, fachadas, a luz e todo o sanguíneo vermelho a acompanhar os abraços, os sorrisos, os cumprimentos e as várias línguas que ressoam nas palavras de conversa. Desde o português, ao espanhol, ao inglês, ao alemão e por aí adiante. A sua textura preza-se por preservar uma linguagem tão ampla e universal como a própria música. Mas tudo isto se propaga além da música. No mesmo amplo corredor, observam-se as distintas e subversivas peças do francês Dehn Sora. No arranque do dia, estaria não só a chegada a solo de Emma Ruth Rundle, como ainda em exibição “Where Does A Body End?”, documentário dos Swans, seguido pela primeira Amplitalk do fim de semana com Alexis Marshall, Colin H. Van Eeckhout e a própria Emma.

Por esta altura, já o público se fazia sentir em grande densidade pelos corredores do Hard Club. O tão louvado ambiente de festival vive-se como se de um constante estado de presença se tratasse. Segue-se a procissão da sala 2. A dupla Candura entrega-se ao fumo e distorção como se de uma cascata sonora se tratasse. Com uma pulsação de noise e atmosfera drone destemidamente arrepiante e anatómica, a soundtrack que podia muito bem pertencer a um Incendies de Villeneuve ou até mesmo ao Begotten dedica-se à aniquilação da alma em estado de destilação. Um testemunho em primeira mão ao real e fatal som da raça humana, e de todos os seus fracassos e massacres. Logo de seguida, os Birds In Row sobem ao palco principal para receber uma sala cheia pronta para os abraçar. Tantas foram as vezes que estes vieram tocar a Portugal em digressões deslavadamente D.I.Y., em caves e pequenas salas. Mesmo num palco enorme como este, mantêm-se humildes e “eles próprios”, indiferentes à arrogância do holofote. Não demorou até os primeiros empurrões surgirem no público. Estranhamente bem composto por uma nova geração de ouvintes (muita juventude), a quem tanto faz sentido a música dos Birds In Row, ressoam-se letras, refrões e cantos em malhas como “13-58”, “I Don’t Dance” e “O’ Dear”, que no final renderam um profundo Hard Club a um memorável aplauso.

Birds in Row e Candura

Daughters, ambiente e Author & Punisher


Uns instantes depois, toda a massa viria a sucumbir não à melodia, nem ao triunfo da cor. Daughters, por sua vez, são a encarnação do monocromo. Do estridente. Do latente esófago existencial. A abrir com “The Reason They Hate”, não demorou observar o quinteto a engolir todo o público presente. A enorme acentuação no último You Won’t Get What You Want fez-se sentir num alinhamento focado na descarga mental em faixas como “Long Road, No Turns”, “The Ocean Song” e “The Lords Song”. Com direito a revisita ao seu homónimo, tocaram-se ainda “Our Queens” e “The Dead Singer”, que muito previsivelmente incendiaram toda a sala num frenesim de dança, stage dives e ataques epilépticos. “Satan in the Wait”, “Daughter” e “Less Sex” sangraram e dançaram este concerto como um dos, senão o melhor de todo o fim de semana.

A coagulação está alta. Testemunha-se concerto memorável atrás de concerto memorável. Após tamanho mergulho no abismo, a sala 2 estaria em condições para receber Author & Punisher e o seu industrial a sucumbir a anatomia hidraúlica com as letras “This machine kills fascists” em pleno exemplo. Mesmo elevando os escombros das malhas do mais recente Beastland, “Terrorbird” continua a ser a fatal faixa que mais facilmente impõe todo e qualquer ouvinte a seu dispor. O final da noite está cada vez mais próximo e todas as texturas que o ritual reúne vibram agora na nuca, nas mãos e cabeça, de todo e qualquer corpo diante de Amenra. Para quem os viu já inúmeras vezes, o espetáculo é sempre o mesmo. Mas será mesmo esse o foco dos belgas? Entreter? Não. É sentir. É despir a apatia do mundo real, das subversivas condições de vida, de todo o peso consciente e subconsciente da realidade, para se unirem em um só ritmo de cada vez, com toda a energia e aura da missa. Mesmo elevando um dedicado público a malhas como “Boden”, “A Solitary Reign”, “Razoreater”, “Diaken” e “Nowena l 9.10”, é impossível destacar um só momento quando todo o corpo sonoro se eleva desde o início ao fim, de forma uniforme, sempre intensa e sem hesitação.

Depois de um seguimento destes, não há realmente corpo que sobreviva a tanto castigo. Ainda fossem concertos que se limitassem à observação, ou à mera apreciação do que acontece em palco… Mas não. A energia comunica de forma tão física e fulgurante, que é irresistível e notavelmente difícil não responder à música e ao artista da mesma forma. A primeira noite está a chegar ao fim. Que forma de terminar o dia senão na presença da ambivalente e arrebatadora dupla Bliss Signal. Gélidos mas avassaladores, a melodia transcende como partículas subatómicas a pulsar cada corpo presente. Entre batidas de uma rave, devorados pela distorção paisagística de James Kelly, a característica funcionalidade de Bliss Signal opera de forma estranhamente orgânica e avassaladora. A cereja no topo do bolo. Os mais fortes ficaram para JK Flesh, mas já pelas horas tardias de um dia repleto de encontros, reencontros, e de uma mão cheia de concertos intensos em grande destaque, sobra apenas energia para levar o corpo ao descanso.

Amenra, ambiente e Bliss Signal


 

Domingo arrancou ainda mais forte que o dia anterior. O nome Inter Arma parece já começar a pavimentar as primeiras sílabas do dia. O quinteto americano tem oferecido alguns dos registos mais pesados e verdadeiramente massivos da atualidade, mas poder testemunhá-lo ao vivo é admitidamente uma vivência completamente diferente. Quer seja pelos power chords monstruosos, pelos blast beats e transições sempre em bom tempo, não há nada que supere a eficiência de malhas simples e diretas ao assunto. Os riffs impõem, tal como a performance vocal, o público num antro de headbanging e peso. Malhas incríveis como “Citadel”, “A Waxen Sea” e “Howling Lands” comprimiram a sala principal numa tortura medieval de proporções épicas e cavernosas. Portrayal Of Guilt cumprem o mesmo propósito mas de forma diferente. O agent orange dos texanos passa por tocar rápido, curto e grosso. A emoldurar uma cáustica apresentação de screamo com soslaios de noise, grind, black e tudo mais, o tridente mostra com clarividência e ferocidade o porquê de serem uma das, senão a melhor banda de screamo na atualidade.

Estranhamente, apesar da hora, Pelican é claramente um dos nomes mais desejados do dia. Sendo o grupo mais acarinhado na anterior vaga de post-metal, estes são capazes de ser uma das bandas mais influentes no estilo. A enchente na sala principal foi gritante perante a afirmação. A banda mostrou-se principalmente focada no seu recentemente lançado Nighttime Stories, tendo ainda tempo para revisitar Forever Becoming. Mesmo com um som que não se mostrou uniforme ao longo da sala, o destaque é completamente merecido. Esta foi a edição de estreia dos portugueses Gaerea. Coletivo cujos esforços se têm mostrado ao longo da Europa, e até mesmo na Ásia. Recebê-los por fim num dos festivais mais “apropriados” para a sua estética e ambivalência, foi na sala 2 que o ritual do abismo se aprofundou com domínio e enorme força.

Amplitalk, Inter Arma e Portrayal of Guilt

Pelican e Gaerea


O cansaço é cada vez mais gritante na cara dos presentes. No entanto, quer seja pelas bancas de merch, os discos, os bares ou a arte em exibição, o convívio mantém-se sempre com tão boa energia que é impossível não recuperar fôlego e manter a força para continuar. São oito da noite, e os Touché Amoré voltam a Portugal dois anos depois da sua última visita. Celebra-se o décimo aniversário do seu primeiro disco …To The Beat Of A Dead Horse e a celebração foi ensurdecedora e sentida. Ouvem-se o bater das palmas a iniciar “And Now It's Happening In Mine”, e pouco depois ressoa-se numa só voz as palavras: “I'm losing sleep, I'm losing friends, I've got a love hate love, with the city I'm in. I'll count the hours, having just one wish, If I'm doing fine, there's no point to this.” de “Honest Sleep”. Com direito a passagem por clássicos como “Pathfinder”, “~”, “Home Away From Home” e “Just Exist” a puxarem a melhor reação possível da enchente à frente do público, foram mesmo as visitas pelo mais recente Stage Four que se rechearam em emoção e sentimento. Relembrando-se aqui o porquê de espaços, bandas, artistas e públicos como estes entenderem a importância e o significado de catarse. É isto e nada mais, nada menos. Um choro comum, e um sucessivo renascer.

Ainda sem entender o real valor do seu último disco Ordinary Corrupt Human Love, Deafheaven parecem perder alguma da sua característica agressividade vs. a finesse de algumas das suas novas ideias. Muitas vezes assemelhando-se a Smashing Pumpkins com distorção, coexiste uma incerteza com a nova matéria-prima. Sem contar com “Black Brick” e “Brought To The Water”, que são claramente duas das composições mais despidas e straightforward do grupo, “Dream House” foi a única faixa “antiga” do alinhamento, e aquela que ainda suscita uma ideia de balanço perfeito e bem conseguido. Sunbather marcou de tal forma que ainda remete à saudade. Umas horas antes, já se reconheciam as caras dos já muito familiares Deafkids. Após passagem pelo SWR Barroselas Metalfest, pelo OUT.FEST, entre outras datas pelo país fora, o trio de São Paulo confirma-se como a banda surpresa da noite. Apesar da sala já se encontrar residualmente preenchida, os brasileiros foram recebidos de braços abertos.

Touché Amoré e Ingrina

Deafheaven e Nadja


Em 2016, não havia qualquer ideia de que seriam necessários três anos de espera para revisitar o nome e o ritual. A saudade foi imensa. É por isso que é importante diferenciar esta experiência de todos os outros festivais portugueses. Não é, nem nunca foi, uma questão de ser melhor ou mais diverso. Todos o são de uma maneira ou de outra. Mas a diferença está nas pessoas, na atmosfera, no foco que a música ganha, estando esta constantemente alicerçada às pessoas que tornam tudo isto possível. Desde as pessoas que estiveram a vender discos e merchandise, aos próprios artistas que partilham o mesmo espaço que o público como se não houvesse qualquer distinção (e realmente não há), às pessoas que viajaram desde longe, ou de perto, às pessoas que pagaram o bilhete ou trabalharam em imprensa, o Amplifest é especial porque significa, acima de tudo, família. E assim o é não pelo seu contexto musical e artístico, mas por tudo o que interliga cada um dos presentes naquelas quatro paredes desde a uma da tarde às tantas da manhã. Uma nota importante, e em grande apreciação: louve-se quem decidiu, por fim, dispensar o gradeamento do palco principal. Este foi, sem de sombra dúvida, o maior contributo para uma mão cheia de concertos se terem afirmado como dos melhores do festival, e até talvez do ano. Que assim se mantenha. Por agora, sobra apenas dizer: "até à próxima". As saudades já apertam.
por
em Reportagens
fotografia Daniela Jacome


Amplifest 2019 [12-13Out] Texto + Fotos
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