No passado domingo tivemos os prazer de nos deslocar à cidade berço para testemunhar uma aparição digna de um 13 de maio, não de uma divindade religiosa mas de uma outra senhora genuinamente de carne e osso. Falamos, claro, de Angel Olsen, a cada vez mais aclamada cantora e compositora de St. Louis, que nos visitava novamente a solo, desta feita no grande auditório do Centro Cultural Vila Flor. À chegada à sala, o palco apresentava-se enorme e despido, encarando uma enorme plateia repleta e há muito esgotada, tal a admiração que esta senhora tem conquistado pelo nosso país.
Esperava-nos um concerto muito diferente do último que nos foi presenteado no NOS Primavera Sound do ano passado, e assim que Olsen tomou o palco, não houve dúvidas que seria também uma versão muito mais profunda e intimista da artista. Com a simplicidade e à vontade de uma pessoa da casa, entrou silenciosamente na sala e pegou na guitarra, ajeitou o microfone e disparou com “Sans”, do recente álbum Phases. A sua voz melodiosa e o seu olhar hipnotizante rapidamente encheram todo aquele espaço, a sua presença cresceu música a música e, de repente, aquele gigantesco palco que parecia grande demais para a artista foi reduzido a uma pequena sala, onde a mesma parecia cantar para apenas um punhado de pessoas, como se uma reunião de velhos amigos se tratasse. Olsen contava as suas histórias, os seus amores e dissabores, e para isso vinha munida de um reportório muito diferente. Tirava do baú velhas vivências, onde Halfway Home e Burn Your Fire For No Witness não foram esquecidos, mostrou uma nova música e foi falando de expectativa e surpresa, e em como é bom entrar numa sala sem esperar nada e ser depois surpreendida. Falou também de como é cada vez mais difícil encontrar algo genuíno nos nossos dias e, enquanto isso, ali estávamos nós, carregados de expectativas para este concerto e ainda assim surpresos pela imensidão e permeabilidade deste universo criado pela cantora, que parece tão genuíno e real capaz de encher o coração ao público a cada canção.
Tudo acabou com “White Fire”, essa longa despedida que se prolongou por quase dez minutos de música, demasiado curtos para quem adivinhava já que seria esta a sua última canção. É bom ver concertos assim. Numa altura em que quase tudo nos chega através de plataformas digitais, em que temos acesso ao mundo a partir do conforto de casa, em que comunicamos e nos relacionamos através de dispositivos, em que o entretenimento é instantâneo e de fácil acesso, é por vezes fácil esquecermo-nos da autenticidade das coisas, da genuinidade de um concerto e da intensidade do sentimento e da presença. São artistas como Angel Olsen que nos relembram de tudo isto, que nos devolvem a intimidade, o real e o sentimento. Por tudo isto Angel, somos-te eternamente gratos.