Com abril chega a tempestade do Sul, o Moita Metal Fest. Apesar do real temporal de frio, vento e chuva, aqui se acolheu calorosamente a receção do fim de semana festivaleiro na Margem Sul. A entrar no recinto com o amplo espaço disposto para a multidão conviver, comer e beber, não há nada que esteja a faltar como ingrediente de um grande fim de semana. Reconhece-se a poucos instantes da entrada uma atmosfera percetivelmente familiar e local. Não há como não integrar.
Após a chegada chuvosa, brindou-se o abrir das hostes com um grande segmento de bandas portuguesas com Revenge Of The Fallen (vencedora do concurso de bandas) e Dream Pawn Shop. De repente, a negridão aterrou na Moita com o trio de black, IRAE, a ganhar destaques da noite com uma entrega irrepreensível de distorção, dissonância e caos puro. De seguida, subiram os veteranos do death metal, Grog. Sendo uma das grandes referências no estilo, os senhores tiveram todo o calo e experiência em palco, sem qualquer hesitação em pulverizar o já bem composto público na tenda do festival.
Dream Pawn Shop, IRAE e Grog
Já com os primeiros empurrões, a festa começa a aquecer. Os suecos Enforcer foram os próximos a trazer o seu speed/heavy metal clássico ao público. Apesar do grande ambiente, receção e reação por parte da multidão, o concerto destes ficou, infelizmente, marcado pelo som desmedidamente desequilibrado e por algumas falhas técnicas. No entanto, importa salientar o envolvimento do público, que ajudou o grupo a ultrapassar as adversidades. Os lendários teutónicos Destruction recuperaram os solavancos e, com uma entrega digna de destaque, fizeram-se ouvir com o seu esmagamento de thrash à antiga. Rápido, calculado e apto para destruição total. Não houve quem ficasse indiferente à hora e tal destes senhores em palco.
Após esta descarga de thrash, a noite estaria dada como fechada para muita gente, mas haveria ainda muita festa pela frente, com os portugueses Gwydion a instaurar boa disposição nos últimos fôlegos do dia. A assinar um triunfante final da primeira noite, há que tirar o chapéu a estes guerreiros por conseguirem fazer este público empurrar os seus últimos esforços, em prol da festa. Ninguém precisa de Dj’s quando há Gwydion.
Enforcer
O segundo dia chega, mas o temporal parece querer ficar. O tempestuoso trio de bandas que marcou o arranque viu-se diante de um público ainda a recolher forças e a recuperar da noitada anterior. Tanto Moonshade, como Mindtaker e Infranktor conseguiram pôr os músculos a aquecer e colocar algum ritmo no palco do festival. The Voynich Code entregaram uma performance bem declarada de peso e domínio, mesmo antes da pedalada à séria de groove/crossover dos lisboetas Diabolical Mental State. Infelizmente para o punk rock dos Artigo 21, não houve a mesma afluência de público a aplaudi-los como em anteriores grupos, mas apesar disso, que entrega! Quem lá ficou, sabe que foi bom.
Moonshade, Mindtaker e Infraktor
Artigo 21, DMS e The Voynich Code
Em contraste com o punk destes, sobiu ao palco a mais recente promessa do black metal português, Gaerea. Recentemente assinados à Transcending Obscurity e a encarregar uma bagagem enorme de louvor por parte das hordas do estrangeiro, não só apresentaram um dos sets mais memoráveis do festival, como ainda o fizeram com grande repressão sonora e visual. Os veteranos Simbiose e Holocausto Canibal apareceram mesmo antes da passagem para as bandas internacionais, conseguindo mantar a fasquia já bem alta deixada pelos Gaerea. Castigador e pulsante.
O que se seguiu daqui em diante, viu a terra batida da tenda do festival tremer e soluçar com o caos instaurado. Dr. Living Dead, a promulgar crossover thrash com uma energia incomparável e intensa, submeteu o público a um pesado regime de exercício e movimento. Dispensam-se máquinas de fumo com a poeirada que estes suecos levantaram nestes 45 minutos de caos puro. Um bonus point pelo discreto improv no soundcheck com a “Suicide Machine” dos Death. Os veteranos do punk rock nórdico, No Fun At All, certificaram-se que o nível de diversão se mantinha.
Gaerea, Simbiose e Holocausto Canibal
Dr. Living Dead e No Fun At All
Extreme Noise Terror elevou o nome do punk e grind a níveis absolutamente nojentos. As dificuldades técnicas, que até então se tinham dissipado no esquecimento, voltaram na pior altura aquando o set de uns britânicos mal-humorados e com pouca vontade para brincadeira. Eventualmente, o som normalizou e o caos reinou.
O retorno dos polacos Decapitated foi um dos concertos mais aguardados do festival e sem dúvida o mais digno de destaque. Compondo riffalhada castigadora e a envolver o público num mantra de chicotadas psicológicas, foi entre blast beats e riffs a descascar que se sublinhou um assalto completo à mente do espectador. Com um alinhamento a englobar grande parte da discografia da banda, esta foi a que obteve o som mais impecável do festival, o que contribuiu para uma entrega implacável e afirmativa, colocando-os notavelmente um nível acima dos seus antecessores. Um desbaste perfeito a terminar ao mais alto nível para sorte dos mais resistentes.
Decapitaded e Extreme Noise Terror
É evidente o crescimento do Moita Metal Fest. Sem grandes argumentos contra a quantidade de gente que se mobilizou para um dos pontos mais “improváveis” da Margem Sul, e com um cartaz bem equipado e pronto para meter a multidão a mexer, há pouco que se possa pedir mais. Nunca há boas alturas para falhas técnicas, e infelizmente foram estas que marcaram na negativa um ou dois concertos do fim de semana. No entanto, quando se vê uma mão cheia de bancas de merch, bebida, comida, horários sempre dentro da previsão, sem atrasos, e muitas caras sorridentes, há que deixar a reação do público falar por si, e quanto a isso, não há oposição que valha.