
Puce Mary é o projeto a solo de Frederikke Hoffmeier. Dinamarquesa, nascida em ’89 e com ligações fortes ao que é a cena punk que despontou de Copenhaga sob a forma de nomes como os de Iceage e Vår, esta partilha inclusivamente trabalhos com alguns dos mesmos em diversos projetos coletivos, sendo que dos quais fica fácil destacar a negrito o de Body Sculptures. Numa ainda curta carreira discográfica feita exclusivamente via-Posh Isolation, a música de Hoffmeier tem vindo a adquirir contornos que se dividem entre a fisicalidade gutural da power-electronics e uma graciosidade pintada a tons de rosa. The Spiral , disco lançado em Março passado e que Hoffmeier veio agora apresentar a Viseu e Porto - aqui numa parceria entre o Understage e a Matéria Prima -, é precisamente o culminar e prova maior disso mesmo.
Trocando uma abordagem mais áspera por uma bem mais racional, em The Spiral o noise não está lá para ser só noise; há espaço para tectos altos e para silêncio, sim, como o há também para um percutir frenético e para uma serra no lugar dumas cordas vocais, elementos que ali vemos caídos e trabalhados ao que parecem ser as medidas de tempos mágicos do que foi o cinema de terror do século passado. Num palco do Understage iluminado a amarelo e removido a nevoeiro, Hoffmeier pareceu tentar transpor à letra o que conquistou em cima, mas esteve sempre muito longe de ser bem sucedida. É que nem o erotismo desviante nem o próprio senso de suspense cumulativo - ambos tão fortemente entranhados ao que é o registo da dinamarquesa em álbum -, passaram alguma vez ou de forma alguma a palpar-se do lado de cá. Hoffmeier foi acima de tudo uma artista desconectada da sua arte desde o minuto zero, e num género em que nada disso passa tanto assim pelo que é a postura do emissor, a desconexão mediu-se sim na rudeza e remetimento do que lhe ia saindo: noise desligado, estéril e circuncisado; de quem se vem e rebola para o lado.