A noite de concertos iniciou-se às horas previstas mas o público, talvez por ser Português e ainda não perceber o relógio ou devido à incompreensível tendência de saltar as bandas de abertura, ainda demorou umas horas até conseguir preencher minimamente a Sala 1 do Hard Club. Este erro pode ter custado a muitos a possibilidade de testemunhar a abertura das hostilidades por parte dos portuenses Heavenwood, que embora sejam já conhecidos do público da invicta se apresentaram desta vez com Miguel Inglês (Equaleft) como convidado especial. Tarot Of The Bohemians, o mais recente lançamento do colectivo, foi o foco principal do concerto e proporcionou uma boa perspectiva do repertório da banda em todas as suas nuances, desde peso e groove a secções melódicas e refrões contagiantes. A falta de público afectou claramente a performance da banda, que se apresentou um tanto ou quanto morta e pouco convincente à excepção de Inglês, que embora ainda não saiba bem o que fazer com as mãos durante as secções instrumentais, provou mais uma vez ser sem dúvida um dos melhores frontman que o Porto tem para oferecer.
Após a entrega sólida e efusiva dos portugueses chegou a vez dos Madder Mortem subirem ao palco e apresentarem o seu metal progressivo a preparar o caminho para o prato principal da noite. Os veteranos noruegueses do Doom e do Prog foram bem recebidos por um público já mais composto no qual se podiam avistar alguns fãs especialmente animados pelo regresso da banda após catorze anos de ausência no nosso país. Devido a esta ausência, fomos presenteados com uma setlist que se estendeu principalmente aos últimos quatro trabalhos da banda, passando pelos dois últimos LP’s para os quais não foram planeadas digressões e focando-se principalmente no mais recente Red In Tooth And Claw. De baladas de amor e peças de peso sobre a música e o que ela nos dá (e tira) a hinos de rock e batidas dançáveis pouco convencionais para o género, este concerto teve de tudo e colocou a vertente experimentalista e ecléctica dos Madder Mortem em primeiro plano. A presença e energia contagiante dos irmãos Kirkevaag dominaram a performance, lado a lado com um trabalho rítmico sólido e a excelência vocal de Agnete Kirkevaag.
Madder Mortem
Tendo já passado duas vezes por Portugal para promover Cognitive e Tellurian, os primeiros dois trabalhos da banda, a vinda de Soen a propósito do mais recente Lykaia não foi surpresa para ninguém. O que por outro lado pode ter surpreendido alguns é a forma como cada vez mais o espectáculo ao vivo do colectivo encapsula o som e a emoção dos registos em estúdio na perfeição. O supergrupo vai mais longe, intensificando a experiência em estúdio e adicionando uma componente de improviso e interacção com o público absolutamente sublime. A introdução do concerto indicava que “Canvas” seria a primeira faixa a ser interpretada e assim foi, começando com material do álbum de estreia, que os Soen iniciaram uma viagem que iria explorar a sua discografia de uma forma bastante uniforme. Em boa verdade este concerto teve o equilíbrio perfeito que nenhum álbum da banda conseguiu até agora atingir. Os momentos calmos e introspectivos foram de uma beleza indescritível e as secções pesadas foram agressivas e impactantes, sendo que ambas as facetas da banda estavam bem representadas e sequenciadas de forma a suscitar interesse e surpresa. Martin Lopez entregou precisamente o que qualquer fã de Opeth esperaria dele enquanto lenda da percussão progressiva e tinha o público nas mãos mesmo que escondido por detrás de um muro de timbalões. Stefan Stenberg (baixista) e Lars Åhlund (guitarrista) suportaram a banda perfeitamente embora tenham eventualmente ficado no pano de fundo face ao destaque de Joel Ekelöf e Marcus Jidell, que na voz e guitarra respectivamente dominarama multidão sem sequer derramarem uma pinga de sour. Desde o refrão icónico de “Savia” ao instrumental colossal em “Jinn” até aos temas habituais como “Fraccions” e “Tabula Rasa” ou até o ponto final do concerto com “Lucidity”, a setlist foi quase perfeita (faltou “Oscillation”, algo que poderia ser considerado crime). Os refrões foram cantados em uníssono por todos os ocupantes da sala e os momentos de clímax musical brilharam com o público a trautear leads de guitarra em loop infinito.
Numa noite recheada de boas performances é quase inconcebível pensar que o espectáculo do cabeça de cartaz foi capaz de eclipsar tudo o que tinha acontecido anteriormente. Dito isto, e embora todas as performances tenham sido bastante agradáveis, os Soen provaram definitivamente que o hype que os suporta é justificado e não ficaram dúvidas de que reúnem todas as condições para continuar a construção de um legado gigantesco para a música progressiva.
Soen
(Nota: o autor não utiliza o novo acordo ortográfico)