Years to Burn é um álbum que surge de uma colaboração entre Iron & Wine e Calexico. Sem prejuízo das contribuições de todos os artistas envolvidos, os nomes que dão particular vida a este álbum são o de Sam Beam (vocalista de Iron & Wine), de um lado, e Joey Burns e John Convertino (Calexico), do outro.
Years to Burn surge como um álbum firme e consciente, fruto de uma parceria intelectual e artística. “What Heaven’s Left”, a música inaugural, é produzida de forma incrivelmente intimista e acústica, com uma brandura paternal, afetiva e familiar. Um country suave que nos embala e ameniza quaisquer pressões internas ou externas. A faixa é tao lírica quanto se consiga conceber, tanto na própria letra, como na entoação e encontros sonoros. Aliás, a bateria nunca soou tão harmoniosa. Aqui se ergue uma ode a outrem, um alguém que nos traz à vida e nos relembra quem somos: “I could be lost in the hills, dead on my feet / And like the morning, you'll find me in time / You take my doubt, let me believe”.
“Midnight Sun”, a faixa seguinte, liderada pela voz de Joey Burns, apresenta-se como mais introspetiva, mais imersiva e vaga. Salientam-se alguns acordes do rock trazidos pela guitarra que rematam esta profundidade mais mística, entretanto contrastada por um pender elétrico áspero que nos devolve a sobriedade, num trilho suavemente conturbado, que caracteriza todo o álbum.
Em “Father Mountain”, os acordes da guitarra insinuam-se fugazmente, na imediata fração de segundo em que a música principia, sem nenhuma escala crescente. O que parece vir revelar o ímpeto confiante e maduro que distingue este álbum. Um amadurecimento que não podia ser tão objetivamente demonstrado quanto o é nesta faixa. A maturidade das vozes, a maturidade da combinação de instrumentos, numa sensatez que paira sobre cada acorde, cada sonoridade. Uma mensagem transmitida de forma concisa e poética, numa sabedoria maturada que tem urgência em ser partilhada. “There's only one way off the mountain after all.”
E, de repente, numa quebra colossal, passamos a “Outside El Paso”. Um instrumental movimentado, muito diversificado, embora com uma linha de continuidade que é a sobriedade aqui manifestada pelo trompete, que sobrevive à indefinição dos ruídos, dos elementos de fantasia, por vezes agitados e sombrios.
Depois deste devaneio, voltamos ao alinhamento normal e expectável… Mas desejável, refletido, continuamente, numa maturidade invariável que se sente no decurso do álbum, através dos tons quentes e aveludados de uma melancolia simultaneamente racionalizada e poética que Sam Beam tanto domina, de mãos perfeitamente entrelaçadas com a marca trazida por Calexico, com influências distintas do sudoeste americano, mais marcadamente texano, e o recurso a texturas e estilos musicais ligeiramente psicadélicos.
Esta parceria é uma verdadeira unificação dos traços sonoros representativos de Calexico e Iron & Wine. A solidez e consistência desta fusão revela-se com especial clareza na faixa “The Bitter Suite (Pájaro / Evil Eye / Tennessee Train)”, composta por 3 capítulos desiguais. O primeiro capítulo é sinalizado por entre acordes tristes, nostálgicos, da guitarra espanhola que ganha voz na pessoa de Jacob Valenzuela e, repentinamente, dá lugar a um despertar apressado, trazido por uma cantiga de dois acordes, culminando, finalmente, num retomar da postura, da sobriedade, do racionalizar da emoção que se desfaz no horizonte muito abruptamente.
Há alguns toques de genialidade reprimidos ao longo do álbum que - propositadamente ou não – acabaram por não ser manifestados em toda a sua extensão e potencial, dando por vezes lugar a uma apatia que seria facilmente contornável, não afetando, porém, o mérito e beleza genuínoa deste trabalho artístico.
“Years to Burn”, a faixa que batiza o álbum, revela a vulnerabilidade que se quis assinalada, embalando-nos delicadamente. O álbum é encerrado com “In Your Own Time”, uma música trauteada por Beam e Burns, que intercalam versos entre si num equilíbrio perfeito que, aliás, reveste todo o álbum. “Because we only want a life that's well worth living”, só pode denotar um sentido de realização e prazer jocoso que, com certeza, os ouvintes partilham após se deixarem emergir neste álbum.