Converge. Os suspeitos do costume, se o crime que a acusação refere é o de produzirem, sem falha, os desígnios mais consistentes e abalroadores no espetro do metalcore extremo e vizinhanças. É que parecendo que não, já lá vão três décadas de atividade e nove entradas full-length num repertório praticamente irrepreensível, e se a idade, porventura, começa a pesar nos membros do quarteto oriundo de Boston, tal não se traduz de todo na qualidade intemporal e incontornavelmente possessa das suas conceções. A sinalizar uma carreira com duas mãos cheias de lançamentos de longa escala chega agora Bloodmoon: I – devidamente numerado porque certamente ainda há mais por vir nesta linhagem –, que traz consigo novas e encantadoras caras. Antes de mais, não nos esqueçamos de Chelsea Wolfe – cujas introduções se dispensam entre adoradores do gótico –, porque tanto quanto consta, este álbum é tanto deles como dela, e por muito boas razões. Mas a cantora-compositora com inclinações para o sombrio não surge de mãos a abanar: traz consigo Ben Chisholm (produtor já familiarizado com a mesma, entre outros membros da Sargent House) e Stephen Brodsky, que se reencontra com uma série de rostos mais que familiares.
Não é todos os dias que a nossa dianteira é contemplada com tamanho line-up. Quarteto tornado septeto, ainda que apenas no contexto deste projeto, clarificam-se assim as intenções dos demais: conceber uma admirável orquestra do macabro, não só apta a testemunhar por uma banda sonora de dimensões e expansividade inaudita, mas a conjugar dois quadros sónicos que, embora partilhando características espirituais entre eles, demonstravam, pelo menos até hoje, afinidades empíricas não tão equivalentes. De um lado, o canto eufónico, ainda que dramático e tenebroso a seu próprio respeito, de Chelsea Wolfe posiciona-se ou como destaque da dita faixa, ou como ferramenta de harmonização indispensável que subjaz o timbre ríspido de Jacob Bannon. Do outro, temos ainda a intensidade, apesar de em grau bastante reduzido, caracterizante de Converge. Verdade seja dita, não se avista por aqui a complexidade matemática nem a cadência espasmódica de projetos anteriores, mas, de igual modo, não é caso para contestar a identidade da banda.
O fruto de todas estas disparidades não é tão díspar em si. Na dinâmica criada, sendo que há flexibilidade para esse mesmo dinamismo recair, em qualquer instância, para um dos lados sem medidas dicotómicas, sugere-se uma nova liberdade para explorar tensões ou consonâncias numa diversidade de texturas e gradações simbióticas. Seja cósmico, misterioso, críptico ou arrebatador o adjetivo escolhido, o que resta no final de contas é uma corrente de faixas coerentes e compatíveis em todas as perspetivas temáticas possibilitadas. Em retorno, a ocasião revela, num maior foco, tanto o cruzamento de folk com doom e gothic rock, como noutras ilustra uma paleta tingida de tons metálicos dilatados pela produção do próprio guitarrista Kurt Ballou, mas acima de tudo isso, revela ainda o potencial iminente de um supergrupo que reconhece os moldes em que ambas as estéticas melhor se entrelaçam, atuando em conformidade com os pontos fortes de cada uma. Pela química que se dispõe entre membros e as suas respetivas funções, bem que podíamos assumir que as paisagens vastamente soturnas de Bloodmoon: I não seriam as primeiras que esta formação havia concebido. Mas não, este é apenas o começo de um projeto cujo nome esperamos, com dedos cruzados, que se volte a fazer ouvir.