Exploradas as paisagens cáusticas e de alta octanagem em Brutalism, exumada a dualidade da lírica perfurante e sentida recostada em secções sónicas de alto arrojo em Joy as an Act of Resistance, e reiterado, porém numa intensidade ainda mais ampla, tudo o que de melhor estes dois projetos exibiam na sua terceira proposta ULTRAMONO, a próxima entrada na discografia dos IDLES não se prendia tanto com uma questão de “quando”, mas mais pertinentemente “o quê”. Com a produção entregue a ninguém menos que Kenny Beats, cujo catálogo de colaborações dificilmente se conseguiria enumerar aqui na íntegra, o quinteto britânico de post-punk parte rumo a novas frentes em CRAWLER, numa tentativa de encerrar o capítulo em que podemos seguramente agrupar os três lançamentos que o antecedem, de modo a não alongar a estadia da estética sonora até agora prevalente por mais tempo do que esta seria bem-vinda.
Tais esforços são aparentes logo nas primeiras instâncias. «MTT 420 RR» não perde tempo a denunciar o tom opressivo e algo encardido que se virá a impor durante a primeira metade do álbum. A mudança é mais que aparente e revê-se sobretudo na aura asfixiante e opressiva que dá origem à narrativa em destaque. Mergulha-se numa temática de choque, colisão, desorientação e crise de identidade. Faixas como «The Wheel» e «Car Crash», entre tantas outras, começam rapidamente a amontoar-se à medida que o storytelling pitoresco de Joe Talbot nos vai relatando os ciclos viciosos e rotinas depreciativas das quais tantos de nós nos tentamos livrar frustradamente. A utilização de instrumentação despojada de grandes emoções, muitas vezes centrada essencialmente na conjunção rudimentar do baixo com a bateria, enaltece ainda mais o sentimento de desolação, de não saber como sair de um labirinto que, aparentando não ter saída, se vai contraindo cada vez mais, até que fica verdadeiramente sufocante e insuportável.
Mas se, por um lado, a primeira metade do álbum favorece uma perspetiva mais atribulada e problemática, a sua sequela desperta sob uma ótica bem mais otimista e esperançosa. «Beachland Ballroom», com as suas aspirações a balada de soul, surge como um movimento de libertação, uma revivida noção de que o controlo está novamente em nossa posse. Com «Crawl!», onde notamos um verdadeiro ponto de viragem na semântica que se vocaliza, abre-se a possibilidade de escapar às rédeas do passado, de “rastejar” de um lugar escuro e desolado para um outro de emancipação. Asserta-se um processo de revitalização que perdura até ao final do disco.
Conceptualmente, o seguimento temático pretendido em CRAWLER é claro, mas os moldes em que as suas ideias são executadas, por muito inovadoras que se possam declarar, sentem-se assumidamente menos impactantes do que aquilo a que a banda nos habituou. Da mesma maneira que certas faixas indicam que o grupo procura uma nova direção no seu som, outras refletem uma postura algo pusilânime e precavida. Ainda assim, sustenta-se, sem margem para grandes dúvidas, o argumento de que este não será um passo em falso na discografia do grupo. Os alicerces para uma nova fase de IDLES – uma era em que o coletivo já não se rege pelo medo de atuar fora da sua zona de conforto e em que se expressa no domínio que bem quer e lhe apetece – já foram erguidos. Basta agora afinar os pormenores.