Sinkane é um nome que resulta de uma palavra mal compreendida numa letra de Kanye West, a partir do qual Ahmed Abdullahi Gallab (a.k.a. Sinkane) projeta a imagem de uma entidade divina africana à qual atribui o mesmo nome. Desta forma, podemos ver Sinkane enquanto o pregador de uma realidade surreal utópica ao colocar esta ideia no centro da sua expressão musical. Gallab cria música colorida, quente e com um groove conseguido através de um arsenal pouco convencional de sons culturalmente enraizados que destacam a comunicação de um sentimento de comunidade e meio festivo que se exibe, sobretudo, nos coros de vozes.
O título do seu sétimo disco, Dépaysé, exprime a ideia de afastamento de um território familiar em prol da descoberta e captura de outros ambientes culturais, ao confrontar com temas líricos que realçam a união, o indivíduo e a sua exclusão – algo que resulta diretamente das suas próprias experiências enquanto americano de origem sudanesa. Gallab revelou anteriormente ter como objetivo abordar tópicos pouco menos que angustiantes relativos à experiência humana no seu geral, de uma forma mais facilmente digerível, ao impor uma expectativa de mudança benevolente e enfatizar a compaixão.
Aquilo que se destaca enquanto correção em Dépaysé foi a eliminação do seu falsete recorrente em álbuns anteriores, que embora não fosse particularmente impressionante, também não era de todo problemático. É possível que, devido à tomada de consciência das suas limitações vocais, Sinkane tenha preferido o uso mais cuidadoso do seu timbre natural, dando mais consistência à voz neste disco.
A guitarra in-your-face faz uso do fuzz, wah-wah, octaves e outros efeitos típicos do rock psicadélico que se agregam ao ritmo de inspiração africana, aos toques de reggae em músicas como “Mango”, “Ya Sudan” ou “Stranger”, e a uma intenção funky generalizada. Esta vertente psicadélica é óbvia, sobretudo, no single homónimo do disco, onde a anteriormente declarada influência em Funkadelic se faz ver. O recurso a sintetizadores é reduzido, que apenas completam a multidão de texturas existentes, o que permite que os detalhes não se tornem cacofónicos. Foi tudo minuciosamente estudado.
“Ya Sudan” é um deslize, embora não se possa considerar um ponto fraco. Apesar de repetitiva com a intenção de ser catchy, parece ser uma música construída com o propósito de comunicar com um público, de tal forma que parece necessitar desse público para que o seu impacto se possa projetar totalmente.
Já “The Searching” é discutivelmente o ponto de fusão do álbum. Arranca com um riff de guitarra de punho forte, quebrado pelo arrancar de notas de ritmo staccato que é afastado para plano de fundo durante o resto da música. Aquilo que funciona especialmente bem nesta música é a progressão e expressividade comandada pela voz corpulenta, que estimula uma convulsão tónica ideal.
Dépaysé não foi um desvio em relação às obras anteriores de Sinkane, não o é em sonoridade, estética ou tema. Se algo mudou, foi a melhor pronunciação destas características, e se Gallab considerou Life & Livin’ It o seu melhor trabalho no decurso da sua carreira até então, Dépaysé deve ser colocado no mesmo patamar.